quinta-feira, 6 de junho de 2013

Extinção de aves grandes, causada pelo homem, tem impacto negativo na evolução de plantas da Mata Atlântica

Em matas sem tucanos, os palmitos encolhem


Ao contrário do sabiá, o tucano-de-bico-preto consegue se alimentar de frutos maiores do palmito juçara, perpetuando a variedade nas áreas que habita.


 
A estreita conexão entre os destinos de presas e predadores é bem conhecida dos estudiosos da extinção de espécies: se a presa desaparece, logo seu predador vai pelo mesmo caminho. Quanto mais especializada é a dieta do predador, mais curta é sua sobrevivência após o desaparecimento da presa, como aconteceu com a águia-de-haast (Harpagornis moorei) da Nova Zelândia, predadora natural dos gigantescos moas (gênero Dinornis), aves que atingiam até 3,5 metros de altura. E se, ao contrário, é o predador que desaparece, a proliferação sem controle da presa leva à explosão populacional, com graves consequências sobre o ecossistema, como aconteceu com os alces, nos Estados Unidos, após a extinção local dos lobos.

Embora menos óbvia, existe uma conexão semelhante entre animais e plantas: aextinção local de certas aves pode afetar a evolução de plantas das quais se alimentam. A afirmação está na última edição da revista Science, publicada por cientistas das universidades Estadual Paulista Júlio Mesquita(Unesp), de São Paulo (USP), Federal de Goiás (UFG) e pesquisadores da Espanha e do México (*). Sob coordenação do especialista em dispersão de sementes e docente do Departamento de Ecologia da Unesp, Mauro Galetti, eles estudaram detalhadamente a ocorrência do palmito juçara (Euterpe edulis) em 22 áreas da Mata Atlântica, demonstrando o efeito do desaparecimento de aves grandes, como araçaris e tucanos.

Os frutos do palmito juçara são fonte de alimento para mais de 50 espécies de aves, entre as quais figuram papagaios, sabiás, arapongas e jacus, além de tucanos e araçaris. Algumas dessas aves retribuem a boa refeição levando as sementes para longe da palmeira-mãe, onde os novos pés de palmito encontram boas condições para brotar e crescer.

Na mata onde ainda existem todos os tipos de aves dispersoras, brotam palmeiras com frutos de todos os tamanhos. Mas onde já não vivem aves grandes e o sabiá trabalha sozinho, só crescem palmitos de frutos pequenos, do tamanho certo para uma ave pequena carregar. Essa alteração na evolução dos frutos de juçara foi registrada em locais onde os tucanos foram extintos há mais de 50 anos pela caça ou devido ao desmatamento e à fragmentação da floresta.

Segundo Mauro Galetti, análises genéticas e ecológicas confirmam a alteração, levantando uma nova frente de preocupação para com a conservação da biodiversidade: “As pessoas acreditavam que a seleção natural demonstrada por Charles Darwin levava muitos anos para ocorrer, mas nossos dados mostram que a extinção de aves grandes causada pelo homem, seleciona rapidamente as plantas com sementes pequenas”.

Tem mais: a redução no tamanho das sementes pode fazer muita diferença para a viabilidade das novas gerações de palmeiras juçara em anos mais secos, pois as sementes pequenas tem mais dificuldade para sobreviver ao dessecamento. “Esse trabalho mostra a relevância da integridade da floresta para manter os grandes dispersores de sementes”, conclui o coordenador da pesquisa. “Os tucanos são importantíssimos para as plantas, porque além de eles dispersarem muitas sementes, eles estão entre as poucas aves que comem e transportam sementes grandes. Com sua extinção, muitas outras espécies de plantas podem sofrer os mesmos impactos detectados no palmito juçara”.

(*) Mauro Galetti, Roger Guevara, Marina C. Côrtes, Rodrigo Fadini, Sandro Von Matter, Abraão B. Leite, Fábio Labecca, Thiago Ribeiro, Carolina S. Carvalho, Rosane G. Collevatti, Mathias M. Pires, Paulo R. Guimarães Jr., Pedro H. Brancalion, Milton C. Ribeiro, Pedro Jordano.

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